1 de setembro de 2016

Usemos de misericórdia para com a nossa casa comum


MENSAGEM DE SUA SANTIDADE
PAPA FRANCISCO 
PARA A CELEBRAÇÃO DO
DIA MUNDIAL DE ORAÇÃO PELO CUIDADO DA CRIAÇÃO
01 DE SETEMBRO DE 2016


Usemos de misericórdia para com a nossa casa comum


Em união com os irmãos e irmãs ortodoxos e com a adesão de outras Igrejas e Comunidades cristãs, a Igreja Católica celebra hoje o «Dia Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação». A ocorrência tem como objetivo oferecer «a cada fiel e às comunidades a preciosa oportunidade para renovar a adesão pessoal à sua vocação de guardiões da criação, elevando a Deus o agradecimento pela obra maravilhosa que Ele confiou ao nosso cuidado, invocando a sua ajuda para a proteção da criação e a sua misericórdia pelos pecados cometidos contra o mundo em que vivemos».[1]

É muito encorajador que a preocupação com o futuro do nosso planeta seja partilhada pelas Igrejas e comunidades cristãs em conjunto com outras religiões. De fato, nos últimos anos, foram empreendidas muitas iniciativas por autoridades religiosas e organizações para sensibilizar mais a opinião pública sobre os perigos da exploração irresponsável do planeta. 

Quero aqui mencionar o Patriarca Bartolomeu e o seu antecessor Dimitrios, que durante muitos anos não cessaram de se pronunciar contra o pecado de causar danos à criação, chamando a atenção para a crise moral e espiritual que está na base dos problemas ambientais e da degradação. Em resposta à crescente solicitude pela integridade da criação, a III Assembléia Ecumênica Européia (Sibiu, 2007) propunha que se celebrasse um «Tempo em prol da Criação» com a duração de cinco semanas entre o dia 01 de setembro (memória ortodoxa da criação divina) e 04 de outubro (memória de Francisco de Assis, na Igreja Católica e noutras tradições ocidentais). 

A partir de então, aquela iniciativa com o apoio do Conselho Mundial das Igrejas, inspirou muitas atividades ecumênicas em várias partes do mundo. Deve ser também motivo de alegria o fato de em todo o mundo iniciativas semelhantes, que promovem a justiça ambiental, a solicitude pelos pobres e o serviço responsável à sociedade, terem feito encontrar pessoas, sobretudo jovens, de diferentes contextos religiosos. 

Cristão ou não, pessoas de fé e de boa vontade, devemos estar unidos manifestando misericórdia para com a nossa casa comum – a terra – e valorizar plenamente o mundo em que vivemos como lugar de partilha e comunhão.

1. A terra clama...

Com esta Mensagem, renovo o diálogo com «cada pessoa que habita neste planeta» sobre os sofrimentos que afligem os pobres e a devastação do meio ambiente. Deus deu-nos de presente um exuberante jardim, mas estamos a transformá-lo numa poluída vastidão de «ruínas, desertos e lixo».[2] 

Não podemos render-nos ou ficar indiferentes perante a perda da biodiversidade e a destruição dos ecossistemas, muitas vezes provocadas pelos nossos comportamentos irresponsáveis e egoístas. «Por nossa causa, milhares de espécies já não darão glória a Deus com a sua existência, nem poderão comunicar-nos a sua própria mensagem. Não temos direito de o fazer».[3]

O planeta continua a aquecer, em parte devido à atividade humana: o ano de 2015 foi o ano mais quente de que há registo e, provavelmente, o ano de 2016 sê-lo-á ainda mais. Isto provoca secura, inundações, incêndios e acontecimentos meteorológicos extremos cada vez mais graves. As mudanças climáticas contribuem também para a dolorosa crise dos migrantes forçados. Os pobres do mundo, embora sejam os menos responsáveis pelas mudanças climáticas, são os mais vulneráveis e já sofrem os seus efeitos.

Como salienta a ecologia integral, os seres humanos estão profundamente ligados entre si e à criação na sua totalidade. Quando maltratamos a natureza, maltratamos também os seres humanos. Ao mesmo tempo, cada criatura tem o seu próprio valor intrínseco que deve ser respeitado. Escutemos «tanto o clamor da terra como o clamor dos pobres»[4] e procuremos atentamente ver como se pode garantir uma resposta adequada e célere.

2. ... porque pecamos

Deus deu-nos a terra para a cultivar e guardar (cf. Gn 2, 15) com respeito e equilíbrio. Cultivá-la «demasiado» – isto é, explorando-a de maneira míope e egoísta – e guardá-la pouco, é pecado.

Com coragem, o amado Patriarca Ecumênico Bartolomeu tem, repetida e profeticamente, posto em evidência os nossos pecados contra a criação: «Quando os seres humanos destroem a biodiversidade na criação de Deus; quando os seres humanos comprometem a integridade da terra e contribuem para a mudança climática, desnudando a terra das suas florestas naturais ou destruindo as suas zonas úmidas; quando os seres humanos contaminam as águas, o solo, o ar... tudo isso é pecado». Porque «um crime contra a natureza é um crime contra nós mesmos e um pecado contra Deus».[5]

Em face do que está a acontecer à nossa casa, possa o Jubileu da Misericórdia chamar os fiéis cristãos «a uma profunda conversão interior»,[6] sustentada de modo particular pelo sacramento da Penitência. Neste Ano Jubilar, aprendamos a procurar a misericórdia de Deus para os pecados contra a criação que até agora não soubemos reconhecer nem confessar; e comprometamos-nos a dar passos concretos no caminho da conversão ecológica, que exige uma clara tomada de consciência da responsabilidade que temos para conosco, o próximo, a criação e o Criador.[7]

3. Exame de consciência e arrependimento

O primeiro passo neste caminho é sempre um exame de consciência, que «implica gratidão e gratuidade, ou seja, um reconhecimento do mundo como dom recebido do amor do Pai, que consequentemente provoca disposições gratuitas de renúncia e gestos generosos (…). Implica ainda a consciência amorosa de não estar separado das outras criaturas, mas de formar com os outros seres do universo uma estupenda comunhão universal. O crente contempla o mundo, não como alguém que está fora dele, mas dentro, reconhecendo os laços com que o Pai nos uniu a todos os seres».[8]

A este Pai, cheio de misericórdia e bondade, que aguarda o regresso de cada um dos seus filhos, podemos dirigir-nos reconhecendo os nossos pecados para com a criação, os pobres e as gerações futuras. «Todos nós, na medida em que causamos pequenos danos ecológicos», somos chamados a reconhecer «a nossa contribuição – pequena ou grande – para a desfiguração e destruição do ambiente».[9] Este é o primeiro passo no caminho da conversão.

Em 2000, também ele um Ano Jubilar, o meu predecessor São João Paulo II convidou os católicos a arrepender-se da intolerância religiosa passada e presente, bem como das injustiças cometidas contra os judeus, as mulheres, os povos indígenas, os imigrantes, os pobres e os nascituros. Neste Jubileu Extraordinário da Misericórdia, convido cada um a fazer algo parecido. 

Como indivíduos, acostumados a estilos de vida induzidos quer por uma cultura equivocada do bem-estar quer por um «desejo desordenado de consumir mais do que realmente se tem necessidade»,[10] e como participantes dum sistema que «impôs a lógica do lucro a todo o custo, sem pensar na exclusão social nem na destruição da natureza»,[11] arrependamo-nos do mal que estamos a fazer à nossa casa comum.

Depois dum sério exame de consciência e habitados por tal arrependimento, podemos confessar os nossos pecados contra o Criador, contra a criação, contra os nossos irmãos e irmãs. «O Catecismo da Igreja Católica apresenta-nos o confessionário como um lugar onde a verdade nos torna livres para um encontro».[12] Sabemos que «Deus é maior do que o nosso pecado»,[13] do que todos os pecados, incluindo os pecados contra a criação. Confessamo-los, porque estamos arrependidos e queremos mudar. E a graça misericordiosa de Deus, que recebemos no sacramento, ajudar-nos-á a fazê-lo.

4. Mudar de rumo

O exame de consciência, o arrependimento e a confissão ao Pai, rico em misericórdia, levam-nos a um propósito firme de mudar de vida. Isto deve traduzir-se em atitudes e comportamento concretos mais respeitadores da criação, como, por exemplo, fazer uma utilização judiciosa do plástico e do papel, não desperdiçar água, comida e eletricidade, diferenciar o lixo, tratar com desvelo os outros seres vivos, usar os transportes públicos e partilhar o mesmo veículo com várias pessoas, etc.[14] Não devemos pensar que estes esforços sejam demasiado pequenos para melhorar o mundo. Tais ações «provocam, no seio desta terra, um bem que sempre tende a difundir-se, por vezes invisivelmente»,[15] e incentivam «um estilo de vida profético e contemplativo, capaz de gerar profunda alegria sem estar obcecado pelo consumo».[16]

De igual modo, o propósito de mudar de vida deve permear a maneira como estamos a contribuir para a construção da cultura e da sociedade a que pertencemos: de fato, «o cuidado da natureza faz parte dum estilo de vida que implica capacidade de viver juntos e de comunhão».[17] 

A economia e a política, a sociedade e a cultura não podem ser dominadas por uma mentalidade de curto prazo nem pela busca de imediato benefício financeiro ou eleitoral. Pelo contrário, aquelas devem ser urgentemente reorientadas para o bem comum, que inclui a sustentabilidade e o cuidado da criação.

Um caso concreto é o da «dívida ecológica» entre o Norte e o Sul do mundo.[18] A sua restituição exigiria cuidar do meio ambiente dos países mais pobres, fornecendo-lhes recursos financeiros e assistência técnica que os ajudem a gerir as consequências das mudanças climáticas e promover o desenvolvimento sustentável.

A proteção da casa comum requer um consenso político crescente. Neste sentido, é motivo de satisfação o fato de que, em setembro de 2015, as nações da terra adotaram os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e, em dezembro de 2015, aprovaram o Acordo de Paris sobre as mudanças climáticas, que se propõe o difícil mas fundamental objetivo de conter a subida da temperatura global. Agora, os governos têm o dever de respeitar os compromissos que assumiram, enquanto as empresas devem responsavelmente cumprir a sua parte, e cabe aos cidadãos exigir que isto aconteça e também se aponte para objetivos cada vez mais ambiciosos.

Assim, mudar de rumo consiste em «respeitar escrupulosamente o mandamento primordial de preservar a criação de todo o mal, tanto para o nosso bem como para o bem de outros seres humanos».[19] Há uma pergunta que nos pode ajudar a não perder de vista este objetivo: «Que tipo de mundo queremos deixar a quem vai suceder-nos, às crianças que estão a crescer?»[20]

5. Uma nova obra de misericórdia

«Nada une mais a Deus do que um ato de misericórdia (…), quer se trate da misericórdia com que o Senhor nos perdoa os nossos pecados, quer se trate da graça que nos dá para praticarmos as obras de misericórdia em seu nome».[21]

Parafraseando São Tiago, «a misericórdia sem as obras está morta em si mesma. (...) Devido às mudanças no nosso mundo globalizado, algumas pobrezas materiais e espirituais têm-se multiplicado: demos pois espaço à criatividade da caridade para identificar novas modalidades operativas. Desta forma, o caminho da misericórdia tornar-se-á sempre mais concreto».[22]

A vida cristã inclui a prática das tradicionais obras de misericórdia corporais e espirituais.[23] «Estamos habituados a pensar nas obras de misericórdia uma a uma e enquanto ligadas a uma obra: hospitais para os doentes, sopa dos pobres para os famintos, abrigos para os que vivem pela estrada, escolas para quem precisa de instrução, o confessionário e a direção espiritual para quem necessita de conselho e perdão… Mas, se as olharmos em conjunto, a mensagem que daí resulta é que a misericórdia tem por objeto a própria vida humana na sua totalidade».[24]

Obviamente, a «vida humana na sua totalidade» inclui o cuidado da casa comum. Por isso, tomo a liberdade de propor um complemento aos dois elencos de sete obras de misericórdia, acrescentando a cada um o cuidado da casa comum.

Como obra de misericórdia espiritual, o cuidado da casa comum requer «a grata contemplação do mundo»,[25] que «nos permite descobrir qualquer ensinamento que Deus nos quer transmitir através de cada coisa».[26] Como obra de misericórdia corporal, o cuidado da casa comum requer aqueles «simples gestos quotidianos, pelos quais quebramos a lógica da violência, da exploração, do egoísmo» e se manifesta o amor «em todas as ações que procuram construir um mundo melhor».[27]

6. Para concluir, rezemos

Apesar dos nossos pecados e os desafios tremendos que temos pela frente, nunca percamos a esperança: «O Criador não nos abandona, nunca recua no seu projeto de amor, nem Se arrepende de nos ter criado (…), porque Se uniu definitivamente à nossa terra e o seu amor sempre nos leva a encontrar novos caminhos».[28] 

No dia 01 de setembro em particular, e depois no resto do ano, rezemos:

«Ó Deus dos pobres, 
ajudai-nos a resgatar os abandonados e esquecidos desta terra
que valem tanto aos vossos olhos (…).
Ó Deus de amor, 
mostrai-nos o nosso lugar neste mundo 
como instrumentos do vosso carinho 
por todos os seres desta terra.[29] 
Ó Deus de misericórdia, 
concedei-nos a graça de receber o vosso perdão 
e transmitir a vossa misericórdia 
em toda a nossa casa comum.
Louvado sejais. 
Amém».


Francisco




[2] Idem, Carta enc. Laudato si’, 3; 161.
[5] Discurso em Santa Bárbara, Califórnia (8 de Novembro de 1997).
[7] Cf. ibid.10229.
[9] Bartolomeu I, Mensagem para o Dia de Oração pela Salvaguarda da Criação (1 de setembro de 2012).
[11] Idem, Discurso, II Encontro Mundial dos Movimentos Populares, Santa Cruz de la Sierra (Bolívia), 9 de julho de 2015.
[18] Cf. ibid.51-52.
[19] Bartolomeu I, Mensagem para o Dia de Oração pela Salvaguarda da Criação (1 de setembro de 1997).
[23] As corporais são: dar de comer aos famintos, dar de beber aos sedentos, vestir os nus, acolher os peregrinos, dar assistência aos enfermos, visitar os presos, enterrar os mortos. As espirituais são: aconselhar os indecisos, ensinar os ignorantes, admoestar os pecadores, consolar os aflitos, perdoar as ofensas, suportar com paciência as pessoas molestas, rezar a Deus pelos vivos e defuntos.
[27] Ibid.230231.
[28] Ibid.13245.

22 de agosto de 2016

Simpósio Vaticano irá reunir jovens de diversas nacionalidades para debater os ODS


A Pontifícia Academia de Ciências Sociais vai receber em seu simpósio para a juventude, nos dias 30 e 31 de outubro, jovens do mundo inteiro que vão partilhar experiências sobre tecnologia, política, economia e cultura. Na base dos debates estarão os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável promovidos pela ONU, em particular os itens n°. 04 - Instrução de qualidade - e n°. 08 - Trabalho digno e Crescimento econômico.

Neste último ponto, os participantes se concentrarão no item: "criar medidas imediatas e eficazes para erradicar o trabalho forçado; erradicação da escravidão moderna e tráfico de seres humanos; proibição e eliminação das piores formas de trabalho infantil, incluindo o recrutamento crianças-soldados; e até 2025 erradicar o trabalho infantil em todas as suas formas”.


Vale a pena ler a notícia em inglês no site da academia, já que o simpósio será fruto não só das ações propostas pelas encíclicas Evangelii Gaudium e pela Laudato Si', como faz parte do esforço do Vaticano em promover os ODS, dos quais é também uma nação signatária (ainda que seja membro-observador na ONU).

Os pedidos de inscrição podem ser apresentados até 30 de agosto por e-mail - vatican@sdsnyouth.org - e participarão cerca de 50 jovens de todo o mundo, entre 18 e 30 anos de idade. Se você, como eu, vai ficar na vontade por ser apenas "jovem em espírito", não deixe de apoiar o evento com suas orações.

Durante o encontro, os participantes irão apresentar projetos e iniciativas, sendo que serão escolhidos dois projetos para serem promovidos pela na
COP22Em 2017, a iniciativa vaticana será repetida para estudar o resultado e as consequências desta primeira reunião.

27 de julho de 2016

Pequenos tesouros da Laudato Si' - 01


São João da Cruz ensinava que tudo o que há de bom nas coisas e experiências do mundo "encontra-se eminentemente em Deus de maneira infinita ou, melhor, Ele é cada uma destas grandezas que se pregam". E isto, não porque as coisas limitadas do mundo sejam realmente divinas, mas porque o místico experimenta a ligação íntima que há entre Deus e todos os seres vivos e, deste modo, "sente que Deus é para ele todas as coisas". 

Quando admira a grandeza duma montanha, não pode separar isto de Deus, e percebe que tal admiração interior que ele vive, deve finalizar no Senhor: "As montanhas têm cumes, são altas, imponentes, belas, graciosas, floridas e perfumadas. Como estas montanhas, é o meu Amado para mim. Os vales solitários são tranquilos, amenos, frescos, sombreados, ricos de doces águas. Pela variedade das suas árvores e pelo canto suave das aves, oferecem grande divertimento e encanto aos sentidos e, na sua solidão e silêncio, dão refrigério e repouso: como estes vales, é o meu Amado para mim".

Os sacramentos constituem um modo privilegiado em que a natureza é assumida por Deus e transformada em mediação da vida sobrenatural. Através do culto, somos convidados a abraçar o mundo num plano diferente. A água, o azeite, o fogo e as cores são assumidas com toda a sua força simbólica e incorporam-se no louvor. A mão que abençoa é instrumento do amor de Deus e reflexo da proximidade de Cristo, que veio para Se fazer nosso companheiro no caminho da vida. 

A água derramada sobre o corpo da criança batizada, é sinal de vida nova. Não fugimos do mundo, nem negamos a natureza, quando queremos encontrar-nos com Deus. Nota-se isto particularmente na espiritualidade do Oriente cristão. "A beleza, que no Oriente é um dos nomes mais queridos para exprimir a harmonia divina e o modelo da humanidade transfigurada, mostra-se em toda a parte: nas formas do templo, nos sons, nas cores, nas luzes, nos perfumes". 

Segundo a experiência cristã, todas as criaturas do universo material encontram o seu verdadeiro sentido no Verbo encarnado, porque o Filho de Deus incorporou na sua pessoa parte do universo material, onde introduziu um gérmen de transformação definitiva: "O cristianismo não rejeita a matéria; pelo contrário, a corporeidade é valorizada plenamente no ato litúrgico, onde o corpo humano mostra sua íntima natureza de templo do Espírito Santo e chega a unir-se a Jesus Senhor, feito também Ele corpo para a salvação do mundo". [Nota da autora: Vide a "Teologia do Corpo"]

A criação encontra a sua maior elevação na Eucaristia. A graça, que tende a manifestar-se de modo sensível, atinge uma expressão maravilhosa quando o próprio Deus, feito homem, chega ao ponto de fazer-Se comer pela sua criatura. No apogeu do mistério da Encarnação, o Senhor quer chegar ao nosso íntimo através dum pedaço de matéria. Não o faz de cima, mas de dentro, para podermos encontrá-Lo a Ele no nosso próprio mundo. 



Na Eucaristia, já está realizada a plenitude, sendo o centro vital do universo, centro transbordante de amor e de vida sem fim. Unido ao Filho encarnado, presente na Eucaristia, todo o cosmos dá graças a Deus. Com efeito a Eucaristia é, por si mesma, um ato de amor cósmico. "Sim, cósmico! Porque mesmo quando tem lugar no pequeno altar duma igreja da aldeia, a Eucaristia é sempre celebrada, de certo modo, sobre o altar do mundo". 

A Eucaristia une o céu e a terra, abraça e penetra toda a criação. O mundo, saído das mãos de Deus, volta a Ele em feliz e plena adoração: no Pão Eucarístico, "a criação propende para a divinização, para as santas núpcias, para a unificação com o próprio Criador". Por isso, a Eucaristia é também fonte de luz e motivação para as nossas preocupações pelo meio ambiente, e leva-nos a ser guardiões da criação inteira.

A participação na Eucaristia é especialmente importante ao domingo. Este dia, à semelhança do sábado judaico, é-nos oferecido como dia de cura das relações do ser humano com Deus, consigo mesmo, com os outros e com o mundo. O domingo é o dia da Ressurreição, o "primeiro dia" da nova criação, que tem as suas primícias na humanidade ressuscitada do Senhor, garantia da transfiguração final de toda a realidade criada. Além disso, este dia anuncia "o descanso eterno do homem, em Deus". Assim, a espiritualidade cristã integra o valor do repouso e da festa. 

O ser humano tende a reduzir o descanso contemplativo ao âmbito do estéril e do inútil, esquecendo que deste modo se tira à obra realizada o mais importante: o seu significado. Na nossa atividade, somos chamados a incluir uma dimensão receptiva e gratuita, o que é diferente da simples inatividade. Trata-se doutra maneira de agir, que pertence à nossa essência. Assim, a ação humana é preservada não só do ativismo vazio, mas também da ganância desenfreada e da consciência que se isola buscando apenas o benefício pessoal. 

[Nota da autora: Todos devemos ter muito cuidado e humildade para não instrumentalizar os cuidados com a criação em benefício próprio e/ou atribuindo valores rasos às ações a serem tomadas e compartilhadas com os irmãos]

A lei do repouso semanal impunha abster-se do trabalho no sétimo dia, "para que descansem o teu boi e o teu jumento e tomem fôlego o filho da tua serva e o estrangeiro residente" (Ex 23, 12). O repouso é uma ampliação do olhar, que permite voltar a reconhecer os direitos dos outros. Assim o dia de descanso, cujo centro é a Eucaristia, difunde a sua luz sobre a semana inteira e encoraja-nos a assumir o cuidado da natureza e dos pobres.

Fonte: Papa Francisco, Laudato Si' - 234 a 237.

JMJ 2016 - Jovens exortam governos a investir em energias limpas

Durante a Jornada Mundial da Juventude, duas organizações internacionais que representam cerca de 10 milhões jovens estudantes católicos divulgaram segunda-feira (26/07) um comunicado apelando aos governos para investir agora nos postos de trabalho sustentáveis ​​e éticos que esta e as futuras gerações de estudantes e jovens virão a ocupar nos anos vindouros.

Movimento Internacional de Estudantes Católicos (IMCS-MIEC Pax Romana) e os Jovens Estudantes Católicos Internacionais (IYCS / JECI), que representam movimentos estudantis nacionais católicos em mais de 100 países, disseram que o comunicado era sua aceitação do convite feito pelo Papa Francisco em junho de 2015 na Encíclica Laudato Si' se unir para, nas palavras de IMCS e IYCS, “discutir, debater e celebrar a nossa relação com o ambiente, com o outro, com a economia, com o trabalho e com muitos outros aspectos interligados da vida”.

Dado os níveis extremamente elevados de desemprego entre os jovens em muitos países e as referências da encíclica ao "valor do trabalho", as duas organizações sugerem que a substituição de empregos insustentáveis, ​​como os da indústria de combustíveis fósseis, pelos postos de trabalho éticos do futuro, tais como os do setor de energia limpa, deveria ser uma prioridade para os governos. 
[Nota da autora: Os combustíveis fósseis possuem um valor imenso - apesar dos impactos socioambientais - que permitiram a humanidade evoluir até as novas tecnologias "limpas" (com menores impactos ambientais de instalação e operação, pois não se costuma abordar os outros custos socioambientais, incluindo a aquisição de matérias-primas, transformação, transporte, processamento, distribuição, logística reversa e descomissionamentos). A transição tem que ser séria com a transmissão de tecnologias, incluindo os países e populações mais carentes, até ao ponto em que haja realmente condições que permitam substituí-la completamente no atendimento às necessidades físicas das populações humanas] [UTOPIA]

"Se os governos são sérios sobre a redução do desemprego juvenil de forma ética, sem ameaçar a qualidade de vida das gerações futuras, eles simplesmente têm de investir agora em encontrar alternativas para aqueles empregos que poluem o ambiente e contribuem para as alterações climáticas – os quais todos os países já concordam em não podem existir no longo prazo", disse Richard Apeh, Secretário Geral da organização Jovens Estudantes Católicos Internacionais.

A declaração também apela a outros jovens a "trabalhar e ser agentes de mudança em suas comunidades", a fim de "criar um novo mundo marcado pela solidariedade, estilos de vida ecologicamente responsáveis, justiça e paz".

Ecovila em Cracóvia

A declaração é apenas um dos muitos esforços globais para espalhar a mensagem da encíclica durante o Dia Mundial da Juventude. Como parte da campanha #LiveLaudatoSio Movimento Católico Climático Global  criará uma Ecovila em Cracóvia, onde realizará oficinas interativas com jovens católicos sobre como eles podem colocar a Encíclica em prática e viver de forma mais sustentável.

Segunda-feira, 25 de julho, a Universidade Jagellonian sediou uma conferência intitulada 'Ecologia Integral de Laudato Si': a juventude como protagonista da mudança', com o arcebispo de Cracóvia, o Presidente da Comissão Organizadora do Dia Mundial da Juventude, o Ministro do Ambiente da Polônia e um dos conselheiros mais próximos do Papa sobre a Encíclica, Cardeal Peter Turkson. O Movimento Católico Global pelo Clima (GCCM) é uma rede internacional de mais de 250 organizações católicas e indivíduos dedicados a cuidar da criação de Deus, dos pobres e das gerações futuras.


#WYD2016 #JMJ2016


Fonte:
 http://br.radiovaticana.va/news/2016/07/27/jmj_jovens_exortam_governos_a_investir_em_energias_limpas/1246870

28 de junho de 2016

Que dia tão lindo! Aniversário de 65 anos de ordenação sacerdotal do Bentinho!

Amo-o, "avô", e o presente desta festa, nós quem o recebemos: a partilha de seu amor e conhecimento. A Laudato Si' não aconteceria se o Espírito Santo já não houvesse preparado o terreno e semeado nos corações dos predecessores de Francisco e nele, as sementes floresceram e frutificaram - e frutificarão ainda mais, muito mais para honra e glória do Amado.

Que Deus os continue abençoando e protegendo, que nunca deixemos de sempre interceder pelas vossas missões. E que suas suaves presenças sempre permaneçam entre nós como exemplos de humildade e sabedoria.



José de Anchieta e Laudato Si'

Por Pe. Josafá Carlos de Siqueira



No dia 9 de junho celebramos a Festa de São José de Anchieta, este jesuíta canonizado pelo Papa Francisco, cuja vida e obra estão profundamente identificadas com a história de nosso Brasil. Como comemoramos também um ano do lançamento da Encíclica Ecológica “Laudato Si'”, faz-se necessário um paralelismo entre a vida do santo e alguns conteúdos existentes no referido documento sobre o cuidado com a casa comum.
A visão integradora de toda a Criação, na qual as questões sociais estão profundamente unidas com as questões ambientais, conforme nos fala a “Laudato Si'” quando aborda a ecologia integral (LS,139), era algo que estava no horizonte de José de Anchieta quando em 1560 relatou os fenômenos físicos da natureza do Brasil, associando-os com a biodiversidade e os povos indígenas. Certamente esta visão sistêmica foi adquirida a partir de uma conversão ecológica, nascida de um mergulho apostólico de enculturação da fé na realidade local. Esta conversão, que é pessoal e comunitária, supõe uma espiritualidade que nos une a Deus, à natureza e à realidade, e com tudo o que nos rodeia (LS, 216).
Nesta correlação, aparece a temática da ecologia cultural na “Laudato Si'”, que nos recorda a importância de prestarmos atenção às comunidades tradicionais e suas tradições culturais, onde a terra não é um bem econômico, mas dom gratuito de Deus e dos antepassados que nela descansam, sendo um espaço sagrado com o qual precisam interagir para manter a sua identidade e os seus valores (LS,146). Foi desta perspectiva que José de Anchieta percebeu e relatou em sua carta biogeográfica de 1560 como os povos indígenas no Brasil se relacionavam com os fenômenos da natureza, ventos, chuvas, raios, animais e plantas, integrando a diversidade cultural e ecológica. 
Esta relação entre ecologia e cultura era tão forte que ele chegou a afirmar que “existiam muitas outras coisas não narradas que são dignas de menção, e que nós como inexperientes desconhecemos”. Os esforços em escrever uma gramática tupi-guarani, mostram o apreço pela cultura local e o desejo de valorizar aquilo que ela tem de mais precioso no processo de comunicação com os outros e com o mundo circundante. Num país como o nosso, onde a riqueza de culturas tradicionais e da biodiversidade é algo admirável e inquestionável, as mensagens de José de Anchieta e da “Laudato Si'” nos convidam a valorizar mais este patrimônio cultural e ecológico, lutando contra toda forma de banalização e destruição desta dupla riqueza que o Criador colocou em nossas mãos para cuidar, guardar e preservar.
Um terceiro paralelismo entre José de Anchieta e a “Laudato Si'” consiste na busca de um novo estilo de vida, “onde é possível necessitar de pouco e viver muito, dando espaços a outros prazeres como os encontros fraternos, o serviço, a música, a arte, o contato com a natureza e a oração” (LS,223). Ao vir para o Brasil, o apóstolo São José de Anchieta teve que mudar todo o seu estilo de vida europeu, passando a viver com poucas coisas, cultivando o diálogo e a convivência com os povos nativos, desenvolvendo a música e o teatro entre os índios, procurando servir de maneira incansável, adquirindo um novo olhar sobre a natureza rica e prodigiosa de nosso país, mantendo-se contemplativo na ação e cultivando a sua vida de oração como cristão, religioso e sacerdote. 
Esta busca em viver um novo estilo de vida, com mais qualidade e menos rodeada dos excessos de coisas que muitas vezes nos escravizam e não nos realizam em profundidade, é um apelo necessário para superar as feridas que provocamos em nós e na casa planetária comum. Que o testemunho de vida de José de Anchieta e a exortação da Encíclica “Laudato Si'” nos ajudem a galgar estes ideais e a viver mais plenamente a nossa vocação de guardiões da Criação.
Fonte: http://arqrio.org/formacao/detalhes/1289/jose-de-anchieta-e-laudato-si