Entrevista com o Padre Robert Gahl - professor de ética na Universidade Pontifícia da Santa Cruz em Roma - sobre a futura encíclica papal, publicada no portal ZENIT em 24.02.2015.
Boa leitura!
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O Santo Padre Francisco anunciou repetidamente que este ano publicará sua segunda Encíclica e o tema abordado será a ecologia. Uma questão até agora não muito discutida na Igreja, mas é cada vez mais evidente que deve nos preocupar, como cidadãos, mas também como cristãos, porque o meio ambiente é um dom que Deus deu ao homem para que fosse cuidado.
Zenit: Por que agora a Igreja está mais preocupada com a ecologia?
É um ano particularmente importante por ocasião da Conferência das Nações Unidas Sobre as Mudanças Climáticas que acontecerá em Paris de 30 de novembro a 11 de dezembro de 2015. Muitos acham que a Encíclica ajudará a reflexão neste encontro. Mas esta é uma razão circunstancial, pontual.
Será a primeira encíclica papal sobre o tema da ecologia e por que o Papa quer isso? Quer ensinar a todos - e não apenas os católicos - a cuidar mais do meio ambiente. Temos que lembrar que abordará questões mais recentes e aparentemente exóticas tais como lixo espacial, satélites em órbita...
É importante entender porque o Papa quer abordar todas estas preocupações. Principalmente, porque Deus colocou toda a Criação nas mãos dos seres humanos e temos essa responsabilidade recebida por Deus. Nós exercemos o domínio de Deus sobre a Criação. Desta forma, especialmente os batizados podem viver esta tarefa de governar pelo "sacerdócio real".
Há uma outra razão. O Papa está muito preocupado com a periferia e a pobreza e percebe que estes sofrem especialmente por desastres ecológicos. No entanto, o progresso tecnológico está nas mãos das pessoas mais ricas.
Ao mesmo tempo, o Papa está preocupado porque viu na América Latina, a exploração da natureza por parte de grandes empresas multinacionais com objetivo de maximizar os lucros a qualquer custo.
É preciso prestar atenção porque muitos tentaram politizar esta questão e outros tentaram minimizar o teor da Encíclica. Por isso, é importante ir além das discussões politizadas. O Santo Padre, com sua autoridade moral, quer convidar a todos a serem criativos na forma de gerenciar isso e a avançarem em novos projetos.
Zenit: Recentemente, o Papa disse em uma homilia que se preocupar com o meio ambiente não é apenas uma questão de "verde". Por que é importante que os católicos também se preocupem com a ecologia?
Estou lembrando do discurso de Bento XVI no Bundestag, quando também falou do "verde". Ele disse que não havia mais "verde" como tal, porque todos os partidos estavam conscientes e comprometidos com o meio ambiente. E o Papa Francisco quer estar em continuidade com seu antecessor, também nisso.
Em alguns países, o “verde” foi associado ao anticlericalismo e é interessante o porquê disso. A Igreja é naturalmente favorável à ecologia, mas há correntes de neo-paganismo que estão ligadas ao movimento ecológico. Mas não quer dizer que os católicos não estão comprometidos com a defesa do meio ambiente.
Temos mais motivos para defender o meio ambiente, não porque "adoramos" o ambiente como se a Mãe Terra fosse uma deusa, mas porque é um dom de Deus e devemos deixa-la para os outros e temos a responsabilidade diante de Deus de cuidar deste lugar que Ele criou.
Um problema do movimento ecologista é quando se coloca o ambiente acima do homem, o homem deve servir a natureza. Mas de acordo com o cristianismo, o homem se preocupa com o meio ambiente. Devemos ver o meio ambiente como um jardim para cuidar, cultivar, semear e fazer frutificar.
Zenit: Um tema complexo e muito discutido relacionado ao cuidado do meio ambiente é o aquecimento global. Por que falta formação a este respeito?
Em parte, porque é altamente politizado. Na maioria das vezes é usado como slogan político para punir as nações, para conter a inovação. Também porque há muito dinheiro que depende das decisões políticas que são tomadas. Outra razão é a política populacional que pretende limitar os nascimentos nos países em desenvolvimento, que continuam com projetos neo-malthusianos, condenados pelo Papa.
Não se trata de acreditar ou não nas mudanças climáticas e no aquecimento global, é um fato científico. O que nos diz o magistério é que devemos cuidar do meio ambiente e temos de ser cautelosos, também diante das ideologias políticas anti pessoas humanas que aproveitam desses perigos para promover programas contra a família e a vida humana.
Zenit: Este ano teremos a Encíclica do Papa Francisco sobre a ecologia, mas o que os outros documentos do Magistério falam sobre esta problemática?
Dos documentos sobre a Doutrina Social da Igreja me parece importante a Caritas in Veritate. Também a Centesimus Annus faz referência. Há também um documento do Pontifício Conselho para a Cultura e do Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-religioso, que trata sobre interpretações espiritualistas neo-pagãs e da Nova Era e aborda especificamente a questão da água. Mas este será o primeiro documento pontifício dedicado inteiramente ao meio ambiente.
Zenit: Por que você acha que a ecologia não foi uma questão de grande preocupação para a Igreja?
Do ponto de vista filosófico e científico, apenas após a Segunda Guerra Mundial se começou a refletir sobre a relação entre o homem e o ambiente.
Há um pensador muito importante chamado Hans Jonas, que escreveu um livro sobre o princípio da responsabilidade. Esta obra foi usada por muitos ambientalistas como linha guia metodológica, mas para a Igreja o foco é visto como um pouco exagerado, embora tenha ideias interessantes e profundas.
Há um pensador muito importante chamado Hans Jonas, que escreveu um livro sobre o princípio da responsabilidade. Esta obra foi usada por muitos ambientalistas como linha guia metodológica, mas para a Igreja o foco é visto como um pouco exagerado, embora tenha ideias interessantes e profundas.
O princípio da responsabilidade diz que não devemos fazer se não podemos provar que o que fazemos não terá um impacto muito negativo sobre o mundo. Este tipo de ‘prudência’ é muito conservadora e retarda a iniciativa, o empreendedorismo e a criatividade. Sem dúvidas, a Igreja tende a ver o homem de uma forma mais positiva, é verdade que existe o pecado, os riscos da tecnologia; mas a tecnologia também é uma fonte de iniciativas criativas e bem-estar para os homens. O progresso é positivo, mas deve ser bem utilizado. É importante pensar sobre questões como a reciclagem...
A Igreja deve se preocupar com a formação da consciência moral das pessoas. Maltratar o meio ambiente é uma ofensa a Deus, porque Ele criou tudo isso, e também uma ofensa ao próximo.